Antes de entrar no assunto, devo assumir desde já o meu “pré-conceito”.
Tenho uma predileção assumida e quase absoluta por hinos antigos. Não sou
contra corinhos e canções contemporâneas, mas há algo nos hinos que parece
falar mais ao meu coração do que as composições atuais.
Desde já
quero deixar claro que o que escrevo não é uma exortação, muito menos algo que
deva ser tomado como regra. Quero apenas ressaltar composições que não recebem
o devido valor, pois uma devida atenção aos hinos “antigos”
é necessária e traz tremenda riqueza e benefício não só para o canto
congregacional como para a vida devocional de cada cristão. Aqui estão cinco
razões pelas quais devemos cantar e valorizar os antigos hinos da Igreja:
Os hinos, em sua maioria quase absoluta, têm um
conteúdo superior às composições contemporâneas
Esta
afirmação não é uma avaliação doutrinária ou uma crítica às tendências e
ênfases de cada época, muito menos uma tentativa de menosprezar a produção
musical contemporânea. Há várias ótimas composições atuais que merecem ser
incluídas no nosso louvor. Porém, podemos rapidamente observar e constatar que,
em geral, hinos têm um conteúdo superior ao que se produz hoje.
A razão disso é muito simples, e ela nada tem a ver com a
qualidade dos compositores de séculos atrás. Infelizmente, hoje produz-se muita
heresia em forma de cântico. Isso quer dizer que não havia heresias ao longo da
história? Sempre houve! Aliás, muitas heresias atuais nada mais são que velhos
desvios requentados. A razão de quase não encontrarmos hinos fracos em teologia
é que, ao longo do tempo, eles foram esquecidos pela Igreja. Não tenho dúvidas
de que alguém no interior da Inglaterra ou Alemanha, por exemplo, compôs algum
equivalente ao nosso “dá vontade de pular”
ou “minha vitória vai ter sabor a mel”.
A questão é que, com o tempo, somente as músicas de conteúdo forte
permaneceram.
Os
hinos que conhecemos hoje sobreviveram ao teste do tempo e, consequentemente,
ficamos com o melhor do que foi produzido ao longo dos anos. Da mesma maneira,
há algumas canções compostas recentemente que devem ser utilizadas por um bom
tempo, pois merecem ser cantadas por ter conteúdo de qualidade!
Os hinos ampliam a nossa noção do
Corpo de Cristo
O canto congregacional, o acto de reunir-se como Igreja, de unir
a nossa voz a um coral de outras vozes serve para ilustrar que não estamos sós
perante Deus. A dinâmica de levantar a minha voz em louvor junto com os meus
irmãos é algo que me mostra que não estou só, que faço parte de um corpo, que
pertenço a Cristo e a toda uma comunidade de fé.
Mas ao cantarmos hinos compostos antes do nosso tempo, creio que
honramos aqueles que nos antecederam. Da mesma forma que hoje fazemos proveito
de textos escritos por Agostinho, Calvino e tantos outros que viveram antes de
nós, fazemos bem em buscar nas fontes antigas hinos que falam de outras
gerações.
Ao pensar no coro celestial que louva incessantemente a Deus na
sala do trono, imagino-me um dia a cantar e louvar junto da minha esposa, meu
irmão, meus pais, meus avós, os avós dos meus pais, C.S. Lewis, Martinho
Lutero, o Apóstolo Paulo... e por tantos mais! Estaremos todos juntos! Mais de
dois mil anos de Igreja, o Corpo de Cristo ao longo da história, reunido e
louvando numa só voz! Cantar os hinos escritos pelos nossos antepassados é como
uma pequena amostra da união e extensão do Corpo.
Os hinos são testemunhos daqueles
que vieram antes de nós
O leitor conhece a história de Horatio Spafford? Já ouviu falar
de John Newton?
Spafford, um advogado americano, perdeu as suas três filhas num
naufrágio. Ao passar pelo local onde elas teriam naufragado, ele compôs o hino “Se paz a mais doce eu puder desfrutar, se dor a mais
forte sofrer; ó, seja o que for, tu me fazes saber que feliz com Jesus sempre
sou!”
Newton, por sua vez, era um ateu e libertino que trabalhava no
mercado de escravos. Durante uma travessia, o seu navio começou a afundar-se e
ele orou a Deus dizendo que, se Ele o salvasse, abandonaria o seu negócio. Ele
chegou até a lutar pela causa abolicionista. Mas naquele barco, após
sobreviver, ele compôs as seguintes linhas: “Preciosa graça de Jesus que um dia me salvou.
Perdido andei sem ver a luz, mas Cristo me encontrou!”
Estes são apenas dois hinos que testemunham a obra de Deus na
vida de homens alcançados e transformados pelo Espírito Santo. Esses hinos
contam uma história. Assim como a famosa “galeria
da fé” de Hebreus, quero unir a minha voz à dos meus irmãos e
testemunhar dessa graça tão maravilhosa que me alcançou e me transforma a cada
dia. Que tesouro riquíssimo temos nas mãos quando reunimos os testemunhos
cantados ao longo da história!
Os hinos fazem parte da
identidade da Igreja
Há alguns anos atrás, um grupo de jovens veio conduzir o louvor
na minha igreja e esqueceram das transparências, as letras que iam cantar (não
sou tão velho assim, mas na minha época de adolescente e jovem, projector era
coisa de igreja sofisticada e com recursos). Eles perguntaram-me se eu teria as letras que
queriam e fiz uma piada: “A letra mais recente
que temos é a de A ti, ó Deus, fiel e bom Senhor... .” Eles não riram e
fizeram cara de que não faziam a mínima ideia do que eu estava a falar.
Cantarolei algumas linhas e... nada. Fiquei chocado ao saber que um hino que
cantei durante toda a vida, que meu pai também cantou, era-lhes desconhecido.
Por mais que a Igreja não tenha um único hino como um hino
nacional oficial (embora muitos reformados mais entusiasmados gostassem que
fosse “Castelo Forte”), as músicas
compostas ao longo dos séculos servem para contar justamente esta história! A
própria composição de Martinho Lutero remete à Reforma Protestante, o contexto
no qual foi escrita. Ou também o caso dos escravos negros nos Estados Unidos
que cantavam os seus spirituals, canções
que remetiam à esperança de um lar onde não houvesse mais sofrimento. Assim
como esses, os hinos da Igreja contam a nossa história, história esta que está
a ser escrita desde Adão!
E as nossas composições atuais? Bem, as que valem a pena ser
cantadas são a nossa contribuição a este rico legado musical que temos. Tenho
para mim que um cristão que não conhece a música, os hinos, as orações do seu
povo, precisa urgentemente de conhecê-los a fim de fortalecer a sua fé e
edificar a sua alma junto de um povo que já existe há mais de dois mil anos.
Não se ouve na rádio
Não é porque uma música toca na rádio que ela é má (nem boa).
Mas eu gosto de uma música que seja diferente do que costumo ouvir. A música do
louvor não deveria ser abordada como qualquer outra, como uma música que toca
enquanto dirigimos simplesmente como pano de fundo.
Creio que os hinos são únicos e por causa da sua estrutura e
musicalidade diferente, são uma maneira pedagógica de nos habituar a encarar o
canto congregacional como um tipo diferente de música. Há todo um andamento,
uma métrica e harmonia que contribuem grandemente para o louvor congregacional
e a postura que devemos assumir ao louvarmos a Deus. Não que devamos ignorar e
deitar fora qualquer coisa que se assemelhe ao que é contemporâneo e secular.
Só não creio que devamos cantar apenas isso. Um louvor formado por canções de
diferentes épocas e com estilos variados oferece-nos a oportunidade de
expressar diversas facetas e dinâmicas de adoração, desde um hino com um
andamento de marcha que nos convoca para louvar até uma balada cuja letra mais
triste fala de quebrantamento e contrição, por exemplo.
Eu amo os velhos hinos! Em várias ocasiões já fui renovado por
meio deles. Fico sinceramente incomodado quando vejo tantos que os descartam
como apenas “aquela música que minha avó
ouvia...”. Essas canções compostas ao longo da história são
preciosidades que temos o privilégio de cantar ainda hoje! Espero que tenha
conseguido passar para si, caro leitor, um pouco do significado que este legado
musical tem para mim, e que creio que pode lhe fazer muito bem também.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Agradecemos desde já o seu comentário e pedimos que se identifique.
Gratas